Por volta de 1950 morávamos no bairro do Pacaembu, e meus pais costumavam visitar amigos que viviam em Socorro, subdistrito de Santo Amaro. Para nós, crianças, era uma aventura e tanto, pois tínhamos de tomar um bonde conhecido por “camarão”, pela pintura vermelha típica.
Partia da Praça João Mendes e subia pela
Rua Vergueiro e Domingos de Morais e quebrava á direita na atual Rua Conselheiro
Rodrigues Alves até chegar ao Instituto Biológico. A partir daí, a linha dupla
dos bondes entrava numa reta a perder de vista. Parecia que estávamos andando
sobre trilhos de trem. pois sob os mesmos ficavam expostos os dormentes,
cobertos por pedra britada entre os
trilhos. Ao longo do trajeto, observava-se muita mata, com várias chácaras e
com casas mais concentradas nas paradas dos bondes, onde havia também passagens
de nível, tanto para pedestres como para veículos.
Em cada parada havia uma enorme placa,
sustentada por dois postes verticais, pintada de branco, com os nomes das
paradas em preto. As paradas das quais me lembro, eram Parada Ipê, Ibirapuera,
Libanesa, Moema, Indianópolis, Pavão, Vila Helena, Rodrigues Alves, Campo Belo,
Piraquara, Frei Gaspar, Volta Redonda, Brooklin Paulista, Petrópolis, Floriano,
Alto da Boa Vista e Marechal Deodoro. A partir desta, o bonde entrava na
Avenida Santo Amaro, indo em trilhos cercados por paralelepípedos até alcançar
o Largo Treze de Maio, o centro comercial de Santo Amaro. De lá, o bonde descia
para uma praça onde havia um bonde aberto que nos transportava até o Largo de
Socorro, através de uma ponte sobre o rio Pinheiros. Nunca soube por que o “camarão”
era substituído por um bonde aberto. Faço as minhas conjecturas: a) o
“camarão”, sendo maior deveria pesar muito mais que o bondinho aberto e talvez
a ponte não suportasse seu peso! b) o Largo de Socorro era pequeno e não
comportaria as manobras de um bonde tão comprido. Não consegui descobrir o real
motivo (pela Internet). Depois,
fazíamos o caminho de volta, cansados porém felizes pela viagem.
Em 1958, eu estudava no Instituto de
Educação “Professor Alberto Conte” (IEPAC) em Santo Amaro. Eu pegava o bonde
perto da Brahma, no Paraíso, pois a essa altura, morávamos na Rua Manoel da
Nóbrega. No bonde, além dos coleguinhas do IEPAC (que a gente reconhecia pelo
uniforme cáqui típico), convivíamos frequentemente com alguns professores que iam
de bonde para a escola. Destaco em especial, a professora de história, D. Ceci
e o professor de matemática, professor Ettore Bezzi. Sempre havia assuntos para
bate-papos, principalmente sobre futebol, pois não era o ano da Copa?
Presenciei dois acidentes com os bondes
neste trajeto. O primeiro deve ter ocorrido em 1958, pois ainda não tínhamos mudado
para Campo Belo e eu só pegava o bonde de Campo Belo em diante para Santo
Amaro, quando fui morar lá.
Um automóvel, vindo em alta velocidade,
quis atravessar na frente do bonde e chocou-se na lateral do mesmo. Isso foi no
cruzamento com a atual Av. República do Líbano (Parada Libanesa). Corremos até
a janela do bonde para ver o que acontecera, porém vimos o motorista saindo do
carro, tirando o chapéu e coçando a cabeça. Felizmente, parece que não se
machucou. Pudemos pegar um bonde que estava logo à frente do acidentado e não perdemos
aula. Foi motivo de muita conversa nas viagens seguintes
Não saberia precisar quando foi o outro
acidente, contudo foi seguramente após o descrito acima. Havia uma descida
íngreme do Brooklin Paulista até a Parada Petrópolis e os bondes abusavam da
velocidade nessa descida (ao lado da Lacta – Fábrica de Chocolates). Certo dia,
chegando ao Brooklin, deparamos com uma fila de bondes parados. Houve um
acidente envolvendo um bonde e estavam todos parados por isso. Os meus
colegas e eu, curiosos em saber o que sucedera,
fomos até o local. Ocorreu em frente da entrada para a Fonte Petrópolis, onde
se engarrafava água para comercialização. Um caminhão carregado de engradados
com garrafas da fonte, tinha sido atingido em cheio por um bonde que não
conseguiu frear, colhendo e arrastando o veículo por diversos metros. Não sei se
houve vítimas, pois estávamos mais preocupados em nos desviar dos cacos de vidro
espalhados pelo chão e fazer a longa
caminhada até a escola, a uns 5 km de distância. Pelo menos, ninguém foi punido
por ter chegado atrasado.
Em 27 de março de 1968, a última linha de bondes em São Paulo. foi desativada, justamente a que servia Santo Amaro.
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