Em meio
à discussão sobre a saída do Reino Unido da União Europeia (BREXIT), os
britânicos fazem uma pausa para debater o que realmente importa: o chá.
Após a
jogadora americana de futebol feminino Alex Morgan ter feito um gesto em campo
como se estivesse tomando chá, na derrota das inglesas pelas americanas,
durante a Copa do Mundo de Futebol Feminino em 2019, reacendeu-se o debate
entre os leitores do The Times de
Londres, o segundo jornal diário da Inglaterra, sobre um assunto que há muito
aflige o povo britânico: quando se serve chá em uma xícara, o que deve ser
colocado primeiro, o chá ou o leite?
Um
leitor, em uma carta para o editor do jornal, ponderou se Morgan, a jogadora de
futebol, derramava seu leite primeiro. Sugeriu que é correto colocar o leite em
primeiro lugar. Isso inspirou uma resposta no dia seguinte de outro leitor,
discordando dele e desencadeou uma enxurrada de cartas ao editor, as mais
interessantes sendo as seguintes:
Numa
das cartas, um leitor escreveu que se tratava de um problema social, pois o uso
de porcelana barata tende a rachar a louça quando se coloca o chá quente
primeiro. Então, deve-se despejar primeiramente o leite que diminui a
temperatura, assim evitando acidentes.
Outro
leitor argumentou que o chá pode manchar a porcelana e colocando o leite
inicialmente, reduz esse efeito deletério.
Nova
missiva disse que o chá deve ser despejado primeiro, para se determinar quanto
leite é necessário. George Orwell, no seu artigo de 1946 “Uma Bela Xícara de
Chá” também recomenda que se coloque o chá antes do leite, pelo mesmo motivo.
Ou
seja, os britânicos não perdem uma oportunidade para ficarem agitados e
discutir assuntos triviais, porém isso oferece um tipo de visão para o caráter
fleumático dessa gente.
As páginas de cartas dos jornais britânicos são um instrumento
sensível, que pode ser usado para detectar ondas de consternação que emanam do
coração. Por exemplo, o editor de um jornal semanal decidiu eliminar progressivamente
o "senhor" como a forma de se endereçar cartas ao editor, e ficou tão
inundado de cartas raivosas que ele prontamente reverteu a decisão.
Dezenas
de cartas revisadas numa Antologia de 2017 “As Grandes Cartas do The Times” do historiador James Owen,
mostrou que, via de regra, não eram inspiradas por eventos históricos, mas sim
por assuntos bastante banais.
Cita-se
o exemplo de por que os pais da noiva devem pagar as despesas do casamento, por
que ratos parecem apenas roer as teclas pretas dos órgãos das igrejas, por que
as calças masculinas têm que ter bainha, as formas de finalizar uma carta de
uma maneira elegante e amigável. Tudo isso leva a discussões sem fim, porém
calorosas.
Como ele mesmo disse: só
alguém britânico se empolgaria assim.
baseado
em artigo publicado em
The New York Times (eletrônico)
de 08.07.2019
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