terça-feira, 11 de novembro de 2014

DIA DA PAPOULA






Há 100 anos eclodiu a Primeira Guerra Mundial com a invasão austro-húngara da Sérvia em 28 de julho de 1914. Foi um conflito inglório com 10 milhões de soldados e 7 milhões de civis mortos, além de 20 milhões de feridos e mutilados. Para se ter uma noção do número de vítimas, a população total do Brasil em 1914 era de 38 milhões que, na atualidade, representaria a quase totalidade da população do Estado de São Paulo.

Nos países aliados, em especial os de língua inglesa, o “Dia da Papoula” é um dia muito especial, conhecido como “Poppy Day”, e corresponde ao dia 11 de novembro. É o dia em que são realizadas cerimônias em memória dos soldados tombados nas duas Grandes Guerras do século passado, de 1914-1918 e de 1939-1945.

A data de 11 de novembro coincide com o fim da Primeira Guerra Mundial, quando foi assinado o Armistício em Compiègne, na 11ª hora, do 11º dia, do 11º mês de 1918, após ocorrer o colapso do exército alemão em todas as frentes de batalha. Foi a guerra das trincheiras, com um número impressionante de baixas, que nunca deverá ser esquecido: 37 milhões entre mortos e feridos. Este foi um levantamento feito pelos Ministérios da Guerra dos países participantes. Jamais se saberá precisamente o número de inválidos, cegos e outros incapacitados para a vida devido ao conflito.

No entanto, a Primeira Grande Guerra foi apenas um ensaio para a Segunda, na qual, apenas o número de judeus e de outros grupos minoritários mortos chegou a equivaler aos que morreram na Primeira Guerra. A catástrofe gerada pela Segunda Guerra Mundial ainda se reflete no século XXI. Mesmo assim, a memória de muitos é curta e ameaças de novos conflitos mundiais permanecem. Por isso, é tão importante cultuar, para não olvidar, os tombados naquelas duas grandes guerras.

As batalhas travadas na região de Flandres, uma planície subdividida entre Bélgica, França e Holanda, foram verdadeiras carnificinas. A cidade de Ypres foi palco de conquista, reconquista, destruição quase total, gás venenoso e milhares de óbitos. Em 1915, um oficial médico canadense, John McCrae, após ver muitos de seus amigos caírem nos campos de papoulas vermelhas das planícies de Flandres, escreveu um poema considerado o mais famoso da Primeira Grande Guerra, e que fez com que a papoula se tornasse o símbolo dos soldados mortos em batalha. Entretanto, ele não foi morto em campo. McCrae faleceu de pneumonia em 1918, com 46 anos de idade. Traduzo livremente seu poema:

Nos campos de Flandres as papoulas se dobram ao vento

Entre as cruzes, fila após fila,

Que marcam nosso lugar; e no céu

Cantando heroicamente, as cotovias voam

Quase não ouvidas entre canhões a toar em terra.



Somos os Mortos. Há poucos dias

Vivíamos, sentíamos a aurora, víamos o pôr do sol,

Amávamos e éramos amados, e agora estamos deitados

Nos campos de Flandres.

Assumam nossa luta com o inimigo:

A vocês, com mãos débeis lançamos

A tocha; para ser de vocês para segurar ao alto.

Se romperem a fé depositada por nós que morremos

Não dormiremos em paz, embora papoulas cresçam

Nos campos de Flandres.

O primeiro “Dia da Papoula” foi celebrado em 1921 e papoulas foram levadas de Flandres para a Inglaterra, decisão influenciada pelo poema de McCrae. Mais tarde, veteranos incapacitados abriram uma fábrica de papoulas artificiais que são vendidas, anualmente, no “Dia da Papoula”. Todos usam a papoula vermelha presa à sua roupa.       
 Este ano, em homenagem aos mortos na Primeira Grande Guerra, quase um milhão de papoulas de cerâmica foram postas no fosso que circunda a Torre de Londres, produzindo o efeito de “sangue em terra e mar”.
Na Catedral Anglicana de São Paulo, no domingo mais próximo de 11 de novembro, comparecem prelados de vários credos, representantes militares do Brasil e de outros países tradicionalmente aliados, e das Legiões Britânica, Francesa e Belga. São lidos os nomes dos membros da comunidade inglesa em São Paulo que deram suas vidas nas duas guerras mundiais. É uma cerimônia muito emocionante.

A arrecadação com a venda das papoulas artificiais vai para o Fundo Haig, nome dado em homenagem ao Marechal de Campo Sir Douglas Haig, comandante das forças aliadas na frente oeste durante a Primeira Guerra. Este fundo levanta recursos para ajudar mutilados de guerra, geralmente de outras guerras que não as supramencionadas, porque a maioria dos sobreviventes daquelas já se foi.

O Presidente da Legião Britânica finaliza a cerimônia, após ter lido os nomes dos mortos, com as seguintes palavras: “Eles não envelhecerão, como foi deixado para nós envelhecermos. A idade não os cansará, nem os anos os condenarão. No crepúsculo e ao amanhecer, sempre nos lembraremos deles”.

Em novembro de 1918, uma professora americana e humanista, Moina Michael, escreveu um poema resposta ao de McCrae, intitulado “Manteremos a Fé”, que traduzo também livremente:



Oh! vocês que dormem nos campos de Flandres,

Durmam bem — para se erguer renovados!

Pegamos a tocha que nos jogou

E segurando-o ao alto, manteremos a Fé

Por Todos que morreram.



Também apreciamos as papoulas vermelhas

Que crescem nos campos de lutas gloriosas;

Parecem sinalizar aos céus

Que o sangue de heróis não desvanece

Mas dá cor acentuada

À flor que permeia entre os mortos

Nos campos de Flandres.



Usaremos em honra aos nossos mortos

A tocha e a papoula vermelha.

Não receiem que tenham falecido em vão;

Ensinaremos a lição que nos demonstraram

Nos campos de Flandres.

Nos campos de Flandres onde lutamos.


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