domingo, 16 de novembro de 2008

MINHA VIDA DE GATO


Se eu tivesse a capacidade de escrever, em vez de apenas miar, eu diria o seguinte a meu respeito:

Eu sou um gato lindo. Sabem por que eu sei? Porque todo mundo fala assim de mim. Sou uma fêmea e meu dono, sabichão, só me identificou – quando foi me buscar no sorteio do McDonald’s – ao olhar meus documentos. Mais tarde é que descobriu que qualquer gato de três ou mais cores de pelugem é sempre fêmea. Sou predominantemente cinzenta, com manchas brancas e laivos de marrom. Não precisava me fazer passar vergonha perante as criancinhas da lanchonete, que queriam saber: “Tio, o que você está fazendo, levantando o rabo do gato?”

Mesmo assim, simpatizei-me com meus donos – depois eu explico quem é dono de quem... Era o MacDia Feliz e eu estava sendo sorteada. Estava numa jaula, mais parecendo uma gaiola, com dois outros coleguinhas. Estava na cara que um era macho, pois era meio-amarelado, de uma cor só, e o outro era como eu, uma fêmea multicolorida. Eu estava assustada com toda aquela barulheira, os meninos enfiando pauzinhos na jaula, para tentar nos cutucar. Eu me recolhi a um cantinho, mas meus colegas tentavam agarrar o objeto ofensor e faziam um barulho com a boca, soltando um chiado estranho. Achava o gato amarelo nojento, porque estava infestado de pulgas, que andavam por todo seu corpo e eram bem visíveis devido à sua cor. Quanto a mim, ai, que coceira. Portanto, também não estava livre delas, porém se camuflavam no meio dos meus pêlos.

Em suma, livrei-me daquele sofrimento, quando meus novos donos me escolheram. Que sorte a deles! No entanto, os meus primeiros dias não foram nada fáceis. De cara, passei no médico, que me examinou da cabeça às patas. Deram-me um banho. Eu nunca tinha me molhado na vida. Pensava que água fosse só para beber e para fomentar a minha saliva para eu me lamber. Por que não se contentavam em me deixar tomar meu banho de gato sozinha? O médico, que depois fiquei sabendo se chamava veterinário, também me aplicou uma vacina. Ai, que dor!

Ah, minha nova casa, meu lar! Que espaçoso, que gostoso! Um berço só para mim. Parece que o banho me fizera bem. Quase não tinha mais coceira. Como foi que meu dono a chamou? De prurido, irritação; cada palavra gozada que têm esses humanos...

Tenho de cooperar com eles. Sabem por quê? Porque quero permanecer aqui. Deram-me um banheiro particular e até um arranhador especial para afiar as unhas. Então não faço pipi em nenhum outro lugar e sempre cubro com aquela areia cheirosa o produto da minha digestão. É claro que às vezes não consigo controlar meus ímpetos naturais e, certa ocasião, comi flores de uma planta chamada violeta-sul-africana. Sabem o que meu dono me fez? Esfregou meu nariz na terra do vaso. Para quê? Eu não comi a terra; foram as flores de que gostei. Não sei porquê, mas não há mais vasos com plantas no apartamento. Também, pudera. Virei uma viciada por flores. Já viram uma gata viciada antes?

Aos poucos fui crescendo, crescendo e depois de um ano tornei-me uma gata adulta. Sabem como sei que fiquei adulta? Certo dia, comecei a sonhar com gatos e isto me dava um calor! Para tentar me livrar daquela sensação, exercitava as patas traseiras. Meu dono dizia que estava no cio e fazendo quilometragem. Eu não me continha. Miava constantemente. Chorava a ausência de um parceiro. Depois de quase uma semana, tudo voltou como dantes e passei a me sentir novamente uma gata dona de mim.

Falando em donos, nós gatos somos nossos próprios donos. Ninguém consegue mandar na gente. É claro que procuramos colaborar, todavia quando não queremos agrados, fugimos e nos escondemos, e quando um agradinho vai nos deixar melhor, então deitamos no chão e olhamos suplicantes para os humanos, para nos acariciar. E como é gostoso... É de virar os olhos! Às vezes, até faço contorções com meu pescoço e cabeça para cativar ainda mais meus donos. Eles ficam encantados.

Agora, sabem do que mais gosto? É daquela calmaria, quando não tem ninguém em casa. Quando eu era menor, reconheço que aprontava, derrubando objetos no chão, mas eu só queria brincar. Quando chegavam em casa, era pernas-pra-que-te-quero. Ficava escondida até as coisas se acalmarem. Mesmo adulta, de vez em quando não consigo me controlar e faço algumas diabruras. Voltando ao que dizia, com a calmaria, fico com um sono tão gostoso... Deito-me na poltrona do meu dono, onde ele costuma escrever na tela de um vídeo, chamado monitor. Depois que ele sai de lá, a poltrona está quentinha. É tão bom...

Outras vezes, fico no topo de um monte de almofadas que estão no chão. Minha dona o chama de pirâmide, mas, pelo que sei, seu formato nada tem a ver com aquela figura geométrica. Estou falando difícil, não é? Já que não sei escrever, mas se esta capacidade tivesse, escreveria tudo isto. Deixa-me pelo menos aproveitar para mostrar do que sou capaz.

Estou me sentindo otimamente bem. Pude, através de psicografia, fazer com que meu dono digitasse tudo isto no computador, porém não se iludam, fui eu quem mandei. Para não haver nenhuma sombra de dúvida da autoria, assino abaixo.


Jody





A Jody viveu conosco desde 1997 e nos deixou em 2005.

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